Em Busca de Relevância

Através das experiências que a vida proporciona, como fazer a diferença ...

3 de jan. de 2012

Inanição Social

Hoje tive a oportunidade de assistir a uma palestra de Juca Kfouri no TEDxUSP, a qual tratou do problema da administração dos recursos financeiros do governo (e portanto, seus e meus também) destinados aos grandes eventos que estão por ocorrer no Brasil em um futuro próximo: Jogos Olímpicos e Copa do Mundo.
O que me chamou a atenção foi um certo clima de desilusão no qual começou a palestra, onde uma "proposta de revolução" transformou-se numa "reflexão", conforme explicação do próprio palestrante. Não quero aqui discutir ou criticar seus argumentos, pois creio que ele já o fez bem. O que gostaria de tratar aqui é sobre essa sensação de que, a despeito de nossas insatisfações coletivas (ex: com o poder público), nada significativo vai mudar.
Será que já nos acostumamos a aceitar tão passivamente qualquer situação de injustiça coletiva? Digo passivamente, pois em raríssimas ocasiões presenciei um movimento relevante em prol do bem coletivo. E chamo de coletivo aquilo que afeta grande parte da nossa sociedade, da população brasileira por assim dizer.
Uma tarde, após visitar um amigo na cidade de São Paulo, encontrei-me no elevador com uma simpática senhora que, por buscar estabelecer uma prosa, reclamava do aumento abusivo do pão francês nas padarias da cidade.
"Como isto é possível? É um absurdo um aumento desta proporção! Deveríamos fazer algo a respeito!"
Disse ela. E para seguir-lhe a conversa, eu prontamente concordei e acrescentei:
"Com certeza devemos e podemos! No lugar de ir a padaria comprar pão francês, a senhora poderia comprar pão de forma, de uma daquelas marcas gostosas e conhecidas, por um mês, e se todos fizermos assim, as padarias deverão tomar alguma ação a respeito do preço do pão"
Foi aí que a expressão de indignação daquela gentil idosa se acentuou, dizendo:
"Assim não! Não posso ficar sem meu pãozinho!"
Levantei a sobrancelha e lhe sorri, na esperança de que a realidade da situação lhe fosse mais forte que a sua satisfação pessoal, mas minha esperança foi em vão.
Começo a acreditar que estamos, nesta nossa sociedade brasileira, tão centrados em nossas próprias conveniências - e não as chamo de necessidades - que não conseguimos agir caso tenhamos que sair um pouco que seja de nossa zona de conforto. Mas de onde vem esta postura? O que nos leva a agir assim tão insensatamente? Ou será que isto é um mal das grandes cidades somente?
Lembro de um passado recente, numa reportagem jornalística, quando o então presidente Lula se pronunciou a respeito das taxas abusivas dos bancos para manutenção de contas e outros serviços.
"Se você acha caro, mude de banco!"
Confesso que naquele instante me zanguei, imaginando todo o trabalho de mudar meu domicílio bancário, débitos cadastrados, antiguidade, sem falar na gerente da conta que me atendia muito bem. Minha reação não foi muito diferente comparada a daquela senhora no elevador... vergonha...
O que então nos leva a agir desta forma? Por que somos tão egocêntricos em nossas ações? Seriam os meios de comunicação, através das propagandas, que tanto nos induzem a este individualismo? Seria a nossa educação formal, tão voltada à produção e tão pouco à reflexão, que quase nos cega de enxergarmos que a vontade de nossa sociedade deve ser e é mais forte que a de seu contexto? O que é que nos impede de agirmos legal, racional e coletivamente em prol de um bem mais amplo? Minha esposa costuma dizer:
"O umbigo de cada um de nós é muito grande pra que enxerguemos além dele, infelizmente"
Eu realmente quero provar que ela deve estar errada, mas ainda não sei como...
Há 2 semanas, pouco antes do Ano Novo, consultando informações no site do Wikipedia, me deparei com uma mensagem do seu fundador, Jimmy Donal Wales, pedindo por doações para a manutenção deste site. Claro que, amolecido pelo espírito natalino, e querendo contribuir de alguma forma para este site que muito me ajuda, decidi doar módicos US$10 à campanha. Logo em seguida recebi um email, cujo texto se apresentou bastante pessoal, agradecendo meu gesto e garantindo o bom uso do recurso. Nada de mais até aí. Foi então que nesta semana pós festas, fiquei surpreso ao ver uma reportagem dizendo que a campanha de arrecadação de fundos do Wikipedia havia oficialmente terminado pois a mesma havia atingido a impressionante marca dos US$ 20 milhões, conforme os objetivos estabelecidos e formalizados no início da mesma, para a qual mais de 1 milhão de pessoas em todo o mundo contribuíram com diferentes valores, para os quais os agradecimentos da organização eram mais do que cordiais. Fiquei impressionado com algumas características deste processo:

  • A capacidade de mobilização de gente - não é qualquer pessoa ou organização que consegue arrecadações de tanta gente;
  • A transparência nos objetivos - depois de atingido o objetivo, foi anunciado o fim da campanha;
  • O resultado alcançado - não preciso nem dizer quanto US$ 20 milhões são significativos

O que nos impede de fazermos algo semelhante pela nossa sociedade? De nos mobilizarmos pelo bem coletivo, de acabarmos com nossa inanição social, de baixarmos o preço dos carros novos (não diga que é culpa dos impostos segundo este artigo), de reduzirmos a carga tributária sobre a classe média, de ampliarmos a educação para desenvolvermos cidadãos produtivos em vez de parasitas, de impedirmos a classe política de definir seu próprio aumento de salário (tem gente aumentando o soldo por voto próprio)? E tantas outras situações absurdas....
Se alguém tiver uma pequena luz sobre este assunto, ainda que tênue, por favor conte-me. Pois não quero aceitar esta nossa realidade como inexorável... ainda que o estreito caminho de mudança alcance somente os meus filhos quando sejam adultos, terá valido a pena.


26 de dez. de 2009

Saindo da zona de conforto



Nestas próximas semanas estaremos, minha familia e eu, enfrentando o desafio de uma mudança de cidade, a 540 km São Paulo, "expatriados" pela empresa.
Na verdade, para minha esposa, isto não é muita novidade pois o seu pai foi pastor atuante, e a cada 3 a 5 anos a organização o transferia para um novo campo de trabalho, levando-a desde criança a conhecer vários recantos deste país. Mas para mim, uma mudança tem algumas implicações que me preocupam: escola das crianças, qualidade de vida, empregabilidade... enfim, o futuro.
Tratando destas últimas questões, sair de São Paulo tem algumas vantagens: o custo de vida deve cair sensivelmente, o dia deve ganhar umas 2 horas a mais sem o trânsito, a vida deve ficar mais tranqüila e provavelmente conseguirei começar alguma atividade física mais sistemática, e provavelmente conseguiremos morar em uma casa com um pouco mais de espaço externo.
Todas estas coisas são muito atrativas e estimulantes do ponto de vista pessoal, porém o revés deste cenário poderia ser: ficar longe do mercado paulistano ao qual tenho estado ligado a mais de 15 anos, distância dos chegados e amizades conquistadas aqui, uma remuneração potencialmente mais baixa no tempo, falta das beneces de uma vida urbana, cosmopolita e consumista (velho vício...hehehehe).
O lado menos individualista disto tudo incluiria a oportunidade de ver meus filhos crescendo em um ambiente mais tranqüilo e saudável, de poder contribuir numa comunidade menor e fazer diferença àqueles que precisam, de poder construir um novo grupo de amigos, incluir e ser incluído entre outros já estabelecidos, e poder recomeçar qualquer plano ou projeto que este grupo tenha vontade de fazer em pról dos outros, sem os vícios dos já existentes... tudo isto também é muito bom!
Sair da zona de conforto sempre gera ansiedade e cria uns cabelos brancos a mais durante o processo de acomodação, mas também isto nos ensina lidar com o desconhecido, a encontrar forças onde antes pensávamos que não havia, e a apreciar as transformações e desafios que vêm pela frente.
E para aqueles que têm uma ligação com o Divino, estas situações são ótimas para exercitar a fé e a dependência  nEle, coisa não muito natural nos dias de hoje.
Bem, creio que estas simples reflexões talvez sejam uma tentativa inconsciente de analisar a situação que se aproxima e estar mais preparado para ela... seja qual for a razão, isto sempre é um aprendizado.

5 de set. de 2009

Negociar para viver

"Primeiro faça o necessário, depois faça o possível, e de repente, você vai perceber que pode fazer o impossível." Francisco de Assis


Desde hoje cedo, pareceu-me que o dia iria demorar mais do que eu gostaria. Tive que ir a Campinas com as calças na mão, visitar um cliente. Uma chuva que há tempos não via, durante todo o caminho de São Paulo a Campinas, dirigindo um Celtinha alugado que quando o ar condicionado estava ligado, ele não chegava a 120 km/h nem em queda livre.
Após pouco mais de uma hora dirigindo na tensão, cuidando as poças de água pra não sair atravessando a pista, chego ao meu destino para, junto com colegas de trabalho, tentar limpar uma sujeira que um e-mail equivocado causou. Sabe quando você desabafa num e-mail, e sem querer este vai para quem não deveria ler? Agora imagine se esta pessoa é seu cliente? Pois é, foi o que aconteceu.
Bem, a esta altura, o tão almejado projeto que estávamos negociando, certamente já estava perdido, mas pelo menos poderíamos tentar não perder o cliente. Entramos na sala, com uma mesa de escritório e outra redonda para pequenas reuniões, sem luxo mas bem privativo. Surpreendentemente, o cliente nos tratou muito bem em nossa chegada, e logo já foi apresentando seu ponto de vista quanto aos ocorridos, colocando uma pedra sobre tudo. Claro que o discurso não foi tão rápido, e obviamente ele quis valorizar a sua posição como potencial contratante, mas ainda assim isto era pouco em vista da sujeira do tomate pisado.
A parte interessante veio em seguida a uma visita a qual o cliente nos conduziu por toda a sua área de produção e laboratórios. De volta ao escritório, o discurso foi o seguinte: "Este projeto que tenho que contratar está me tirando o sono, e não tenho a chance de errar. Mas agora, depois da cagada de vocês, tenho certeza de que, se eu os contratar, eu poderei dormir tranqüilo, pois quem vai perder o sono serão vocês, pois vocês não podem mais errar...". Pronto! Eu não sabia se ficava feliz por resgatar o contrato já perdido, ou se preocupado com a encrenca que teremos por diante. De qualquer maneira, voltei a São Paulo com o sentimento de realização, feliz por termos mais uma chance...

Chegando de Campinas a Interlagos, estive visitando mais um cliente cujo projeto estava terminando hoje, e era de muito bom tom eu aparecer para ver como estavam as coisas. Durante a visita recebi uma ligação de uma empresa prospect da Inglaterra. A pessoa que me ligou é uma moça, com seus trinta e tantos anos, mãe de uma linda menina, de origem indiana, com 20 anos morando em Londres, a quem tive o prazer de conhecer aqui no Brasil quando ela veio visitar a empresa. Obviamente ela queria tratar sobre uma negociação que estamos conduzindo, pois meu último e-mail colocava praticamente por terra as chances de fecharmos contrato neste momento. E claro que isto não foi assim de graça... a minuta de contrato que recebi não tinha quase nada do que havíamos negociado durante o último mês.
Ainda não entendi bem, mas negociar com indianos tem sido para mim algo como "Concurso de quem conta a maior desgraça" para ficar na vantagem na argumentação. Bem, combinei com ela que nos falaríamos em 2 horas, pois eu precisava chegar em meu escritório para que pudéssemos falar com tranqüilidade.

De Interlagos para a Lapa, durante o fim de tarde de uma sexta-feira, véspera de feriado. Acho que você já imagina o transito que me esperava; ainda bem que aproveitei a viagem para pegar as crianças na escola um pouco mais cedo. Chegando no escritório, entro em contato com Inglaterra para continuarmos nossa conversa. Ficamos por quase 2 horas negociando, procurando caminhos para um acordo que fosse conveniente às duas empresas, cada um contando uma desgraça maior que a outra, porém o tempo e as forças já estavam se esgotando (em Londres atualmente são 4 horas a mais que em São Paulo), foi aí que me lembrei de um dos memoráveis exercícios de negociação que tive durante meu MBA: se está difícil, não queria resolver tudo na mesma hora... dê tempo ao tempo. Então concordamos em pensar mais no assunto, sonhar com ele durante o fim de semana, e assim na próxima quarta-feira, voltarmos com algumas alternativas para fecharmos a questão, assinarmos o contrato e comemorarmos mais uma operação para a empresa.
O bom que vejo disto é que, por mais desgastante que possa ser este processo de negociação, tenho a impressão que a confiança e o relacionamento estão crescendo, pois há um interesse mútuo em resolver a questão, e acima de tudo as pessoas envolvidas estão em primeiro lugar, ainda que o dever seja a motivação deste esforço. Creio que com estas bases, poderemos alcançar objetivos muito mais desafiadores num futuro bem próximo.

Graças a Deus hoje é sexta-feira... e vou almoçar, a esta hora da noite, 2 pedaços requentados de pizza congelada de 2 meses atrás. Nada como um novo dia... dia de descanso.